SXSW 2024: humanos ao centro, superciclo tecnológico e olhar em 2050

O festival termina neste sábado; a conferência, formada por palestras, workshops e seminários se encerra hoje

| Empresas Pioneiras -

Por Douglas Miquelof, diretor de Negócios e Inovação da Compasso Coolab  

 

SXSW aconteceu em Austin, nos EUA
SXSW aconteceu em Austin, nos EUA

Aos frequentadores mais assíduos e de longa data, os relatos são que as edições do SXSW sempre mudam de um ano para outro. Os lugares e formatos podem até serem os mesmos, mas as mensagens mudam e evoluem com a mesma velocidade que a tecnologia avança, impulsionada pela inovação, e tem desdobramentos nas mais diversas áreas dos negócios para as empresas e na jornada de consumo e comportamento para as pessoas.  


Fazer um resumo deste, que é um dos maiores encontros mundiais sobre inovação, tecnologia e transformação, com mais de 25 trilhas de conhecimento, é quase impossível. Mas podemos sinalizar as tendências provenientes de informações, mensagens, notícias e dados, que se repetiram ao longo dos dias do evento nas mais diversas apresentações e debates espalhadas entre o Austin Convention Center, hoteis e instalações de entidades e governos, arriscar e fechar um panorama de macrotendências para esta edição de 2024.  


Dentro das linhas de maior repetição e suas conexões, os pilares das tendências em Austin passam por três linhas principais de conteúdo, transversais a todas as trilhas, os quais refletem um posicionamento do evento que vem evoluindo ao longo do tempo. Menos tech e mais touch.  


Humanidades: pessoas ao centro 

O ser humano foi o principal ponto de partida da grande maioria dos conteúdos apresentados. As 'pessoas ao centro' foi o assunto que mais conduziu as várias discussões ao longo dos dias no SXSW. Tudo parte de algo que visa contribuir, solucionar, facilitar ou arrumar algo no cotidiano das pessoas, seja na vida pessoal ou profissional. Desde a automação, que vai eliminar postos de trabalho e aumentar a produtividade nas empresas, para produtos e serviços mais baratos, passando pela educação, que irá recapacitar as pessoas que perderam seus empregos para novas funções e atividades profissionais, a busca de uma vida com mais qualidade, equilíbrio e saúde mental, chegando até os tratamentos mais avançados para a cura de doenças genéticas. Tecnologia e inovação estão sendo tratadas com a ponte ou via de acesso para estes avanços.  


Claro que a reboque, já que as pessoas estão ao centro, questões ligadas à ética, inclusão, diversidade, sustentabilidade e meio ambiente, trabalho e renda, saúde física e mental, apareceram com alta relevância e frequência nos discursos dos mais importantes palestrantes. Também marcaram presença nos debates em paineis que impulsionaram estes pontos da perspectiva pela qual tecnologia e inovação são, mais uma vez, meios que podem contribuir para a evolução necessária da nossa conduta como sociedade, inclusive amadurecendo e reparando vieses da nossa história. Sem isso, não conseguiremos evoluir dentro de novos parâmetros mais adequados para a realidade presente e o futuro que nos aguarda em breve.  


Superciclo tecnológico: somatória da Biotecnologia (BioTec) com Inteligência Artificial Generativa (AIG) e Internet das Coisas (IoT) 

Entre os conteúdos ligados ao futurismo, inovação e impactos na vida em sociedade, que ajudam a pautar discussões e decisões de negócios na atualidade, ficou claro que estamos chegando em um momento de aceleração de mudanças hipersônicas. Essa denominação foi classificada por Amy Webb, uma das palestrantes mais assíduas e a sensação do evento nos últimos anos, devido a divulgação do seu relatório anual de tendências sempre no SXSW, produzido pela sua empresa Future Today Institute, como Superciclo Tecnológico.   

Amy Webb no lançamento do 2024 Emerging Tech Trend Report
Amy Webb no lançamento do 2024 Emerging Tech Trend Report

"Nós nunca vivemos esta junção e evolução de três movimentos tecnológicos combinados até então", afirmou Webb. Na história recente desde a revolução industrial, a humanidade havia presenciado apenas movimentos únicos e com velocidade que até então nossa mente e corpo podiam acompanhar dentro dos parâmetros fisiológicos que temos registrado como padrão até aqui. Nesta nova era, as mudanças serão mais agressivas, pois a integração de biotecnologia, inteligência artificial generativa e internet das coisas fará com que avancemos para outro nível de consciência humana, mas logo falaremos sobre.  


Claro que estas tecnologias em destaque, que serão responsáveis por movimentar as transformações, não vêm sozinhas. A evolução do processamento quântico por superchips, novos formatos de armazenamentos de dados e informações descentralizadas por sistemas como blockchain, machine learning, realidade imersiva, entre outras, serão potencializadas e combinadas neste processo, tanto que Amy Webb cunhou que estamos entrando em uma nova geração: a Geração T, de transição.  


Outro ponto que Webb chama atenção é sobre a centralização deste poder tecnológico. Pois, como vemos em muitos filmes que se passam no futuro, com o acesso regulado pelo mercado, que irá cobrar seu preço, pode acontecer que a desigualdade entre os humanos se acentue. Claro que a visão sobre o assunto tem sempre uma abordagem mais positiva. O impacto deste movimento promoverá melhorias para a sociedade, mas como são ferramentas, estudos e dispositivos produzidos por empresas privadas em sua grande maioria e, que muitas vezes, estão dentro de grandes grupos econômicos, existe sim o risco da eletrização deste movimento. 


Já na visão do pesquisador e escritor sobre futuro Neil Redding, o futuro será de coexistência entre máquinas e humanos. Em um futuro próximo, a proposta de Redding é que, como a realidade não é objetiva, ela poderá ser cocriada entre humanos e as tecnologias disponíveis para resolver os problemas do dia a dia, oferecendo maior capacidade criativa e qualidade de vida para as pessoas, de forma conectada, preditiva e inteligente. Ele conceitua a proposta usando o termo computação espacial, onde o ambiente físico será integrado com realidades imersivas, promovendo um novo espectro de realidade, um nível mais avançado, que impactará a forma como a sociedade se comporta, se organiza e consome.  

Neil Redding e Douglas Miquelof durante Brazil Creative Economy Meet Up
Neil Redding e Douglas Miquelof durante Brazil Creative Economy Meet Up

Em uma conversa exclusiva com Neil Redding, da qual participei com um grupo reduzido de brasileiros, mais uma vez o ponto sobre vieses foi levantado. Todos concordaram que este é um gargalo da maioria das ferramentas disponíveis, uma vez que elas buscam referências da história, onde muitos pontos como o racismo, por exemplo, precisam ter o devido tratamento, visto que é fato que a sociedade praticou atrocidades em vários setores da humanidade e que, infelizmente, influenciam os resultados das máquinas e precisam de uma curadoria muito mais assídua, apurada e alimentação de histórias do presente para que haja a evolução da consciência dos algoritmos e assim evitarmos novos vieses.  


Futurologia 2050: o novo estado da consciência humana 

Falar de 2050 pode parecer longe, mas faltam pouco mais de vinte e cinco anos. Neste quarto de século, as previsões são de mudanças profundas e acentuadas. Seguindo relatos e usando exemplos, alguns até antigos, como a Lei de Moore de 1965, que previa que o poder de processamento dobraria de velocidade a cada dois anos, os relatos da junção do Superciclo Tecnológico como cunhado por Amy Webb superará qualquer previsão.  


Em pouco tempo, viveremos em  um mundo onde todas as coisas estarão de fato conectadas. Todas as coisas, e isso inclui serviços, do mundo físico serão replicados no mundo virtual, promovendo altos índices de monitoramento, controle e otimização. Com o uso de novos dispositivos integrados aos nossos corpos, teremos uma extensão entre o mundo real com uma camada de realidade imersiva. A holografia, tecnologia que simula a presença de pessoas, deverá representar um campo de avanço integrado com realidade virtual e aumentada, criando reproduções perfeitas de qualquer ambiente. Literalmente é viajar ou trabalhar sem sair de casa, mas com a capacidade de interagir com outras pessoas, que também estão vivenciando este ambiente virtual, tornando a experiência realística, como se todos estivessem juntos fisicamente.  


Agora, se ajeite na cadeira, pois essa evolução vai continuar e se integrar com a biologia. Já está em desenvolvimento o biocomputador. Ele foi criado a partir da combinação de um tecido cerebral humano cultivado em laboratório com circuitos eletrônicos. Esta combinação está sendo inclusive testada usando ferramentas de machine learning, inteligência artificial e conectividade. O potencial desta tecnologia deve levar para o futuro de 2050 uma série de dilemas, só vistos em filmes de ficção científica, como Matrix, por exemplo.   


Imagine que estamos a frente da possibilidade da criação de super-humanos e da vida eterna, vivendo entre o mundo real e virtual, pois dado os avanços do Superciclo Tecnológico, estamos falando de uma nova consciência, onde o corpo será integrado à uma nova máquina biológica, com capacidade de armazenar e transferir informações, conhecimentos e experiências, além de processá-las com altíssima velocidade. Pense que poderemos vivenciar também a possibilidade de comprar conhecimento e fazer o upload para nosso cérebro, ao mesmo tempo, que uma vez nosso corpo envelhecendo, poderemos copiar nosso cérebro para reinstalar em um novo corpo. Em última escala, podemos pensar que em certo ponto, nossa consciência será totalmente alocada em um novo Mundo Virtual, do qual vamos habitar, desprendidos da matéria orgânica.  

Se tudo isso irá acontecer como premeditado pelos especialistas, estudos e experiências, só a história irá contar. O importante é entender que vários destes movimentos estão em estágio avançado de desenvolvimento e impactarão a forma com a sociedade se organiza, consome e interage, levando mais complexidade para os negócios e empresas.  

 

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